O Senado aprovou ontem à noite, por
66 votos favoráveis e nenhum contrário, a Proposta de Emenda à Constituição
(PEC) que garante aos trabalhadores domésticos 17 novos direitos, igualando sua
realidade com a dos demais trabalhadores urbanos e rurais. O presidente do
Congresso Nacional, Renan Calheiros (PMDB-AL), adiantou que vai levar a
proposta à promulgação na próxima terça-feira, dia 2 de abril. A proposta, que
já havia passado pelo primeiro turno de votação semana passada, estabelece novas
regras, como jornada diária de trabalho de oito horas e 44 horas semanais, além
de pagamento de hora extra de, no mínimo, 50% da hora normal. Os direitos vão
se somar àqueles já existentes, como 13º salário, descanso semanal, férias
anuais e licença gestante.
Mesmo sendo uma matéria de consenso na
Casa, tendo tramitado sem grandes discussões nas comissões pelas quais passou,
sete dos 17 itens ainda precisam ser regulamentados antes de entrar em vigor.
Carecem de regulamentação o direito ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço
(FGTS), hoje facultativo, o seguro contra acidentes de trabalho, o
seguro-desemprego, a obrigação de creches e pré-escolas para filhos e
dependentes até seis anos de idade, o salário família e a demissão sem justa
causa.
Segundo dados do Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil tem cerca de 9 milhões de
trabalhadores domésticos. No Estado de São Paulo são 3 milhões e, na Grande São
Paulo, 800 mil. Assim como na votação anterior, vários senadores se revezaram
ao microfone para louvar a aprovação da proposta. É inadmissível que nós
tenhamos até hoje duas categorias de trabalhadores, afirmou o líder do PSB no
Senado, Rodrigo Rollemberg (DF). Trata-se de um grande momento, de um momento
histórico para as mulheres brasileiras, afirmou a senadora Lídice da Mata
(PSB-BA), relatora na Comissão de Constituição e Justiça da casa.
A votação foi acompanhada pelo deputado
federal e ex-senador Carlos Bezerra (PMDB-MT), primeiro subscritor da PEC,
pelas ministras Eleonora Menicucci (Política para Mulheres) e Luiza Bairros
(Igualdade Racial), por Delaíde Miranda, ex-empregada e atual ministra do
Tribunal Superior do Trabalho, e pela deputada federal Benedita da Silva
(PT-RJ), ex-empregada doméstica e que relatou a matéria na Câmara dos
Deputados. O senador Magno Malta (PR-ES) chegou a defender que se batize a
norma de "Lei Benedita da Silva".
Aplaudida em plenário e sentada na Mesa
Diretora, a presidente da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas,
Creuza Maria Oliveira, defendeu a PEC. Nos primeiros meses, quando o salário
aumenta, o patrão demite, mas depois contrata novamente, porque quem trabalha
fora precisa de alguém para trabalhar, mas as pessoas acham que pagar para
empregada doméstica é absurdo. Haverá uma acomodação no mercado, afirmou.
Nova lei engorda Fundo de Garantia
A regulamentação do
direito das empregadas domésticas ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço
(FGTS) poderia significar uma arrecadação extra de R$ 5,5 bilhões por ano para
o fundo. A conta é do economista William Eid Júnior, coordenador do Centro de
Estudos em Finanças da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Considerando um universo
de 7,2 milhões de trabalhadores domésticos - segundo estimativa da
Organização Internacional do Trabalho (OIT)- e o salário médio de R$ 726,8
calculado pelo IBGE, o recolhimento de 8% de FGTS levaria a uma arrecadação
adicional de R$ 418 milhões por mês.
No ano passado a arrecadação bruta do
FGTS atingiu o recorde de R$ 83,0 bilhões, com crescimento de 15% em comparação
a 2011. Além do aumento da participação da população ocupada com carteira de
trabalho assinada, o crescimento real do salário também contribuiu para a
expansão do bolo do FGTS. Se todos os patrões passassem a pagar os novos
direitos trabalhistas às domésticas, o crescimento adicional da arrecadação de
FGTS seria de 1,5%. Não basta apenas mudar a lei para garantir a transformação
de uma cultura arraigada, diz o economista Boa parte das domésticas vai
continuar na informalidade, pois a relação não é puramente empregatícia mas
também afetuosa.
Outra parte do mercado pode ser prejudicada pelo medo dos patrões de ter de
arcar com custos extras, diz Willian Eid. Nos casos das domésticas que dormem
no serviço, por exemplo, ele acredita que a mudança na legislação pode provocar
dúvidas sobre como remunerar as horas extras. Muitas famílias poderão preferir
dispensar a doméstica e contratar diaristas ou mesmo passar a viver sem
empregada.
A tendência, segundo o professor da
FGV, é de que o País evolua para uma nova realidade mais próxima dos países desenvolvidos,
com menos trabalhadores empregados em serviços domésticos. Isso se o mercado de
trabalho continuar favorável ao trabalhador, como nos últimos anos. Se vier
uma crise e o desemprego aumentar, a oferta de trabalhadores desqualificados
cresce e muitos profissionais vão voltar a aceitar emprego doméstico, mesmo na
informalidade e com salários mais baixos, analisa.
Fonte: Tribuna do Norte
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