Mais de 70% da população
brasileira desconfia da polícia. O número é impressionante e a explicação é
simples. A polícia faz o que não deveria fazer e não faz aquilo que deveria
fazer. Não investiga. Não protege. Assusta.
Por que a PM se aproxima com
holofote e armamento pesado nas mãos, ar beligerante, como se todos fossem
suspeitos de tudo? Por que na periferia das cidades passageiros de ônibus são
enfileirados nas calçadas, mãos na cabeça, tratados genericamente como
malandros, ofendidos e revistados, em busca não se sabe de quem?
Por que, em regra, a Polícia
Judiciária só resolve casos criminais em que a autoria é conhecida e fica de lado
aquilo que, para ser investigado, dependeria de meios e inteligência? Em São
Paulo, por exemplo, 79% dos homicídios têm autor desconhecido.
O policiamento ostensivo é
fundamental para a paz pública. Inibe a criminalidade violenta, desestimula
depredações urbanas, confere sensação de segurança ao espaço ocupado. Mas onde
a visibilidade é menor, a abordagem é de arrepiar.
A lei permite que o policial
efetue busca pessoal em caso de "fundada suspeita" de ocultação de
arma ou de objetos relacionados a algum crime específico. Fora daí, em tese, a
abordagem seria arbitrária. Mas o que vale é o veredicto da esquina,
inapelável, o parâmetro subjetivo do policial, que pode se aproximar de
qualquer um sem motivo concreto.
Aqui ainda se prende para
averiguação. Sob o olhar complacente de todos. A polícia aborda não porque
alguém cometeu um delito, mas para verificar se alguém que se encontra em
determinado local pode ser suspeito de algo. É suspeito quem está sem
documento. É suspeito também quem está com documento, mas o policial não gostou
do seu rosto, da sua roupa ou do seu jeito.
A Constituição autoriza no
país prisão em flagrante (qualquer um pode conduzir o preso à autoridade
policial) e prisão preventiva ou temporária decretada sempre pelo Poder
Judiciário e com motivação jurídica.
Prisão para averiguação não
existe na lei brasileira. Só a partir das manifestações de junho, por atingir
estudantes, jornalistas e classe média, esta subversão absoluta do princípio da
legalidade passou a ser observada de forma crítica.
É crime privar alguém da sua
liberdade com abuso de poder, mas a pena é minúscula (multa ou detenção de 10
dias) e os juízes não costumam ligar muito para pequenas arbitrariedades,
voltadas, como se costuma dizer, para o "bem comum". A população, acuada
pela violência urbana e pelos altos índices de criminalidade, acredita não ter
alternativa ao Estado policial.
Ai de quem reclamar. Como
num passe de mágica, a abordagem policial pode se transformar em desacato. Sim,
pode aparecer do nada uma testemunha "imparcial" afirmando que o
soldado foi destratado no exercício do seu dever: o suspeito, porque tentou
resistir ao abuso ou exigir o cumprimento da lei, pode ser preso, falsamente
acusado de um crime que não aconteceu.
Estima-se que cinco pessoas
morrem em confronto com a polícia todos os dias no Brasil. A polícia da cidade
de Nova York matou nove pessoas em 2011. No mesmo ano, foram abatidas 242
pessoas na cidade de São Paulo e 283 na cidade do Rio de Janeiro. Fora o que
não se contabiliza.
Fonte: UOL.com
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